domingo, 5 de julho de 2009

Olhos Abertos

São 01h13 da manhã, o que me leva a escrever, refletir a essa hora? Não sei se esse é o momento, mas hoje foi um dia marcante na história da minha vida. Em todos os sentidos, todos mesmo. Na minha vida profissional, nas minhas relações com o mundo, com meus amigos, na minha relação comigo mesma.

Vi uma criança, uma menininha de uns 4 anos que chegou ao CEU pra realizar matrícula. Cadeirante. Mas isso era um mero detalhe, porque ela era tão ativa, dominava com tamanha destreza a cadeira de rodas que, por alguns segundos, por aqueles breves momentos, isso era REALMENTE um detalhe, dava até pra esquecer, era algo como: “qual é o problema dela, mesmo?” . Mas me doeu o coração ver que as dificuldades que ela enfrentaria na vida seriam muitas e, uma delas, seria ali, no CEU mesmo. “Eu queria estudar aqui… mas não posso, né?” Foi o que ouvi dela. Tudo porque, por sua “deficiência” a mãe teria de acompanhá-la, mas ela não podia, tinha que trabalhar. O que fazer? Me deu vontade de ali, me comprometer com ela, de levantar minha mãozinha e dizer: “Eu, eu me comprometo a levá-la ao banheiro!” Deu vontade de gritar! Mas não é assim que funciona o mundo, não é assim que essa sociedade injusta, isso mesmo, injusta!, não é assim que ela age. Prega a integração, inclusão mas é da boca pra fora, pura fachada, puro modismo. É moda falar em inclusão, é o assunto do momento. Mas e a prática? Por que uma criança como a Ná estava sendo privada do direito de freqüentar uma escola? Alguém, por favor, pegue o ECA e o rasgue em mil pedacinhos! Diga-me por que é que ele consta nos concursos públicos, é bibliografia em tantos lugares, é aclamado, é dito com a boca cheia, se na prática, na vida real ele não está em prática? Por que é que nossos governantes mostram inclusão como uma realidade maravilhosa quando, na verdade, essa realidade não chegou até aqui? E não digo isso só pela Na, mas também pelo Weverton, pelo Rafael, pela Letícia, pelo João, pela Maria, pelo José… por tantas e tantas crianças e mães e famílias inteiras que são diretamente afetadas por essa irresponsabilidade do governo, por essa abstenção da culpa, por essa troca de papéis. Essas crianças são responsabilidade nossa, são responsabilidade do governo, não se trata do filho da Maria, da filha do José, são NOSSAS crianças, filhos de uma sociedade hipócrita, que prega o ativismo, mas peca pela inobservância mais delicada e humana da nossa realidade. Alguém pelo amor de Deus me diga para que raio serve uma escola cheia de escadas, um complexo escolar, sem elevador que funcione, sem gente especializada para atender às NOSSAS crianças? Isso é complexo demais para os meus sentimentos absolutamente humanos que viram e sentiram nos olhos daquela avó, a angústia da busca desesperada por um lugar que receba adequadamente sua netinha. Todos somos diferentes, temos as nossas próprias deficiências, essas sim, sem aspas: o egoísmo, a ingratidão, o conformismo diante da dficuldade apresentada, essas que pesam infinitamente mais do que as “deficiências” físicas ou mentais das NOSSAS crianças. Humanitarismo demais da minha parte? Fraqueza, sensibilidade exacerbada? Não sei, mas, afinal, eu sou humana, vivo cercada de gente humana, vivo numa sociedade liderada por seres humanos, mas… como ficar inerte diante de uma situação tão gritante? A raça humana, acabando e ignorando as necessidades do seu próximo, um próximo tão próximo, mas tão próximo que, muitas vezes, conseguimos enxergar aquele povo distante, que morre de fome, que padece na pobreza, mas não enxergamos a nossa própria pobreza de espírito, pobreza essa, que nos cega e nos faz pensar que está tudo muito belo e muito bonito do jeito que alguém fez. Pra que lutar, pra que mudar, pra que abrir os olhos? Meus olhos se abriram e doeu. Como doeu perceber a cegueira na qual me encontrava, vivendo em meu mundinho perfeito, enquanto o meu próximo tão próximo sofre e padece com coisas nas quais eu nem pensava. Abrir os olhos é preciso. È dolorido, as lágrimas outrora secas, começam a brotar, te fazendo lembrar da tua origem. Somos humanos, todos irmãos… vamos abrir os olhos governantes, vamos abrir os olhos povo, vamos abrir os olhos irmãos.

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